O casal Natália dos Santos Bastos e Luciano Gois Barreto entrará com uma ação na justiça por danos morais, negligência e omissão de socorro devido a morte do filho, Brayan Bastos Barreto de um ano e três meses após, segundo eles, o Hospital Estadual da Criança (HEC), em Feira de Santana, ter negado o atendimento hospitalar ao garotinho que chegou com febre.
O caso aconteceu na última sexta-feira (26). Natália Bastos contou ao Acorda Cidade que acompanhada pelo esposo levou Brayan até a unidade hospitalar já que o menino apresentava um quadro de febre há mais de 24 horas. Porém, ao chegar ao local, foi impedida de prosseguir com o atendimento pois o menino não apresentava o nível de febre exigido pela unidade.
“A gente pela manhã levou Brayan para o Hospital Estadual da Criança. Ele já havia tido em casa um quadro de febre de cerca de 38,5 a 39 graus e a gente estava dando a medicação prescrita pela pediatra dele, porém como já tinha mais de 24h com ele com essa febre em casa, rejeitando alimento e um pouco enjoado, querendo vomitar, a gente resolveu levá-lo para o HEC, que é onde tem toda a estrutura. Chegando lá, não estava cheio, a recepção estava vazia, a gente foi passar pela triagem, e ele estava com 38,4 de febre. Sendo assim, a enfermeira me falou que infelizmente lá não poderiam atender, porque lá só atende a partir de 39 graus, ou casos mais graves, e aí encaminhou, orientou a gente ir para a UPA do Clériston, que fica ao lado, que lá teria uma pediatra e que poderia estar atendendo-o”, disse.
Natália Bastos ainda detalhou que foi a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Estadual, popularmente conhecida como UPA do Clériston, e que conseguiu o atendimento para o filho, porém, ela afirmou que percebeu irregularidades no serviço prestado.
“Fomos para a UPA, a gente fez o atendimento, passou pela triagem também, fizemos a ficha, mediu a temperatura dele e também estava 38,4. Depois disso, fomos para a sala da médica, a médica sequer o examinou, fez somente alguns questionamentos, mas ela não olhou a garganta se estava inflamada, passou um soro e o medicamento. Quando chegamos na sala da medicação, o primeiro enfermeiro que atendeu o Brayan, eu não sei se ele era experiente, mas a primeira veiazinha dele, ele perdeu o acesso e inchou também, aí ele [enfermeiro] chamou outra profissional pra poder pegar a veiazinha na mão dele, essa outra profissional veio e pegou a veiazinha e soltou a medicação. A primeira medicação foi dada e ao trocar para a segunda medicação de soro, não me foi mostrado o que tinha, somente trocou”, acrescentou.
Natália disse ao Acorda Cidade, que após a medicação, Brayan imediatamente começou a agonizar nos seus braços.
“Gritou e eu fiquei procurando o que tinha acontecido, se tinha perdido a veia, comecei a falar com eles, eles disseram, ‘não mãezinha, o soro está caindo, está tudo bem, é isso mesmo’, e aí de repente meu filho desfaleceu nos meus braços, imediatamente Brayan ficou roxo, a boca roxa, foi coisa assim de segundos, ele ficou roxo e parou de responder totalmente”.
Após o episódio, a mãe relatou que pediu socorro aos enfermeiros da UPA visto que, segundo ela, a criança não estava respirando. Natália ainda conseguiu ligar para o marido, que estava do lado de fora da unidade, para pedir que o atendimento ao filho fosse realizado com urgência.
“Coloquei ele na maca, comecei a gritar, pedir socorro, meu filho não estava respirando, e eu gritando, e aí o enfermeiro foi, chamou outro colega, depois colocaram o oxímetro no dedo dele, me disseram assim, ‘calma mamãezinha, está tendo batimentos ali, não se preocupe’, colocaram oxigênio no narizinho dele e não prestaram nenhum tipo de ressuscitação, nada, porém nos batimentos lá eu vi que estavam em 60. Eu estava desesperada, virei ele de lado, fiz a ressuscitação, só que me afastaram para poder colocar o oxigênio. Nesse meio tempo eu liguei para o meu marido, meu marido estava do lado de fora da unidade, lanchando. Meu marido conseguiu invadir a unidade, entrar e chegar lá antes da médica, enquanto eu e meu marido nos desesperávamos lá junto com as outras mães, a médica não chegava e a gente gritava. De repente, ela [médica] chegou andando bem calma, tranquila, olhou e mandou pegar no colo e levou pra sala vermelha, depois disso eu não sei mais o que fizeram com o meu filho”, contou.
Após ser encaminhado a sala vermelha da UPA Estadual, Brayan Bastos foi transferido para o Hospital Estadual da Criança e lá, veio a óbito. A mãe, muito emocionada, relatou ao Acorda Cidade os momentos finais em que esteve com o filho ainda com vida.
“Quando ele entrou na sala vermelha da UPA, a todo momento eu via a enfermeira entrando na sala da medicação das crianças, e falando ‘pega um tubo tal’, como se na sala vermelha não tivesse o material completo para prestar atendimento para ele ser intubado. Passaram-se cerca de meia hora, eu perguntei à assistente social se meu filho estava vivo e ela disse que estava e que ia transferir ele para o HEC. Nessa agonia, procuraram a chave da ambulância e não encontraram, uma desorganização, quando encontraram colocaram na ambulância, ao chegar ao HEC não deixaram nem eu entrar na recepção, me deixaram do lado de fora onde tinha algumas cadeiras e depois de 20 minutos a médica do HEC chamou a mim e ao meu marido e contou que ele tinha vindo a óbito e que tinha chegado sem sinais de vida, mas que ela tinha tentado fazer manobras”, contou.
A mãe recordou que nesse momento ela passou mal e que o marido ficou desesperado. ” Eu passei mal, meu marido surtou, minha mãe estava lá. Que eu me lembre, eu pedi pra ver meu filho e me deixaram entrar na UTI do HEC e tinha um copinho com um pouco de sangue, cerca de 300 ml, ele estava enrolado no lençol e eu puxei e vi o narizinho, a boquinha e o corpinho dele todo sujo de sangue. Atrás dele tinha uma poça de sangue, o lençol estava ensopado, aparentava pequenos cortes no peito e eu não nunca deixei meu filho se machucar em casa pra eu pegá-lo morto e naquela situação”.
Natália Bastos e o esposo, Luciano Barreto ainda contaram ao Acorda Cidade que acionarão as duas unidades de saúde na justiça e que aguardam respostas após a morte do filho. Ela comentou que tem recebido relato de outras mães que também passaram por situações parecidas na unidade de saúde infantil.
“Falei com Deus e a Brayan que um dia a gente vai se reencontrar, eu o amava muito. Meu marido pegou ele no colo. Eu quero que a justiça seja feita, meu filho chegou apenas com febre, e ele não tinha nenhuma comorbidade, ele só chegou com febre, não tenho como provar, mas a perícia será feita e a verdade virá”, finalizou Natália.
O Acorda Cidade entrou em contato com a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Estadual que enviou a seguinte nota de esclarecimento:
“Cumprindo determinação do Conselho Federal de Medicina (CFM), a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) e suas unidades não comentam casos específicos, preservando a privacidade e ética médica. O respaldo dessa medida também se baseia na Lei de Acesso à Informação, assegurando sigilo por 100 anos para informações pessoais. A direção da UPA Estadual de Feira de Santana lamenta o óbito e está disponível para prestar quaisquer esclarecimentos aos familiares”.
Em nota, a Secretaria Estadual de Saúde (Sesab) lamentou o ocorrido e reiterou que abriu uma sindicância para apurar as causa da morte de Brayan Bastos Barreto:
“A Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) lamenta o óbito de Bryan Barreto e imediatamente abriu sindicância para apurar as causas do ocorrido, o que inclui os protocolos de atendimento na UPA Estadual e no Hospital Estadual da Criança, bem como as condutas clínicas. Reiteramos que o serviço social das unidades encontram-se à disposição para quaisquer esclarecimentos aos familiares.
Na oportunidade, informamos que cumprindo determinação do Conselho Federal de Medicina (CFM), a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) não comenta ou fornece informações sobre pacientes da rede de assistência estadual.
Essa medida, que resguarda o paciente e equipe profissional, tem amparo no Código de Ética Médica, Capítulo IX, Artigo 75, em que é vedado “fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos, em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente”. Ainda no Artigo 73, parágrafo único, a divulgação permanece proibida “mesmo que o fato seja de conhecimento público ou o paciente tenha falecido”.
O respaldo dessa medida de não divulgação também está na Lei de Acesso à Informação (art. 31, & 1º, I da Lei nº 12.527), norma que garante 100 anos de sigilo para informações pessoais relativas à intimidade, vida privada, honra e imagem”.
Fonte:Acorda Cidade